SPLIT
O esperado Mar Adriático dá as caras entre um ponto e outro da estrada. A chegada a Split, a segunda maior cidade da Croácia e a maior da região da Dalmácia, é desejada, claro, por apontar o caminho das praias. Outra atração, no entanto, é que chama mais a atenção por ali. O Palácio de Diocleciano, construído por ordem do imperador romano entre os anos de 295 e 305, ainda existe, embora a fachada tenha dado lugar a lojas, bares e restaurantes que recebem o público que visita a riviera na alta temporada. Modernização para a qual os moradores torcem o nariz.
A residência de cerca de 38 mil metros quadrados foi lugar de descanso nos últimos anos de vida do imperador e sua família. Com o tempo, a estrutura abandonada acolheu os primeiros cidadãos de Split, que povoaram a cidade. As muralhas do lugar, hoje reconhecido como Patrimônio Cultural pela Unesco, continuam em pé, compartilhando espaço com antenas de TV das moradias atuais, sem perder a beleza de sua história.
Apesar do choque entre o novo e o antigo nas ruas do palácio, a arquitetura sofisticada da obra imperial é cheia de vida graças ao movimento que se concentra atrás das muralhas. Cerca de 3 mil pessoas vivem em seu interior e algumas áreas têm sido restauradas. Assim como a cidade velha, monumentos como o de Gregório de Nin resistem ao tempo. O Mago, como ficou conhecido o bispo, lutou para que as missas fossem realizadas na língua local e não mais em latim, como eram na época. Por causa de sua importância, foi eternizado em forma de estátua em frente a um dos portões do palácio, mas, na Segunda Guerra Mundial, a imagem foi partida em três e guardada para garantir que não fosse bombardeada. Restabelecida, são seus pés, brilhantes à distância, que atraem o olhar. Uma boa lustrada em um dos dedões e, dizem, é certeza de boa sorte na vida. Não custa arriscar.
A maior parte das praias da Croácia é constituída de pedra e em Split não é diferente – a única da cidade de areia é Bacvice. Na procura por águas translúcidas e tranquilidade, as opções de pedra ocupam o topo da lista. Com o sol insistente até as 8 horas da noite, os viajantes aproveitam cada segundo no mar. A caminhada na promenade de Split fica mesmo para quando o dia cai. A noite fresca faz lotar os bares locais, mas o clima esquenta com algumas boas doses de rakija, famoso destilado local produzido com frutas, como uva, a mais tradicional, e ameixa, e também em versões mais licorosas, como a de mel e pera.
Zdravko Banovic, do restaurante Šperun, sugere forrar o estômago logo após alguns goles da bebida. Cheio de vigor, ele cuida do lugar há dez anos e de um bistrô, um em frente ao outro e ambos do filho, que ele brinca, não aparece nem para comer. Os sabores mediterrâneos do peixe fresco e das hortaliças cultivadas ali mesmo, em Split, o vinho da região e a companhia de Banovic rendem a noite inteira de conversa.
+ SPLIT
A cidade é ponto de partida para algumas das principais ilhas croatas, como Brac, Hvar e Vis. Operadoras locais realizam passeios diários para esses lugares.
PARA ESCAPAR
A 27 quilômetros de Split, a cidade histórica de Trogir é um sossego diante da movimentada vizinha. Sustentada pelo turismo e pela pesca, abriga igrejas, fortalezas e torres, que podem ser escaladas para se admirar a cidade do alto, mas uma placa avisa que o percurso é por conta e risco do viajante, já que os degraus são muitos e tortuosos, como é o caso da Catedral de São Lourenço, monumento mais famoso de Trogir. Com os pés no chão, mas ainda de olho no alto, os mais velhos contam que, no passado, algumas meninas escolhiam seus maridos da janela. Do alto, em suas casas, ficavam de olho nos rapazes que atravessavam as ruas estreitas do centro histórico, desde 1997 também protegido pela Unesco. Pequena, com pouco mais de 13 mil habitantes, Trogir vale a visita. E se o dia for curto, esticar o período pode levar a conhecer algumas das praias locais.
PARQUE NACIONAL PLITVICE
São dois os principais fatores que levam os visitantes à Croácia. A natureza exuberante e as praias de água transparente atraem 9 milhões de pessoas todos os anos, quase o dobro da população do país. Fica fácil entender essa procura ao avistar os 78 metros de queda-d’água da Veliki Slap, ou Grande Cachoeira, a maior do Parque Nacional Plitvice, e os 16 lagos cristalinos que refletem de longe um verde tão intenso quanto a floresta que os cercam. O tom natural, quase turquesa – graças à concentração de calcário e o movimento das águas no ecossistema local –, é convidativo, mas um mergulho por ali nem pensar. Uma placa ao longo do caminho adverte: “Por favor, não pise na vulnerável natureza. A fina camada de calcário leva anos para se formar e pode ser destruída em um raro momento de descuido”. Difícil é olhar por onde se anda diante de tanta beleza. As explicações dos guias do parque se misturam às exclamações de admiração inevitáveis. “Uau” é quase sempre o que se ouve pelas trilhas, que podem levar 1h30 ou até 5 horas.
Plitvice fica entre as cidades de Zagreb e Split e, no verão, cerca de 5 mil pessoas passam pelo lugar, por dia. “É o parque mais antigo e visitado”, conta a guia peruana Bethsy Oclocho-Špoljaric, que há mais de dez anos vive no país. Encantada pela natureza e por um croata, ela resolveu ficar, mas a saudade bate quando ouve notícias de casa. “A América Latina está começando a conhecer a Croácia”, afirma animada com o momento econômico das bandas de cá. E ela está certa. Embora, austríacos, alemães, italianos, ingleses e franceses sejam maioria, os sul-americanos também estão buscando um lugar ao sol na costa da Croácia.
Em 1979, o parque, que abriga centenas de espécies de plantas e animais, entre eles o ameaçado de extinção urso-pardo, foi declarado Patrimônio Mundial pela Unesco. A área protegida de 294,82 km2 só tem o sossego quebrado na área de piquenique, onde a molecada faz farra na temporada de férias. O espaço tomado por mesas e cadeiras reserva o descanso merecido após uma longa caminhada. Por ali, ainda, uma lanchonete serve porções generosas de batatas fritas e sanduíches, refeição que se torna ainda mais saborosa pelo ambiente ao ar livre. O passeio pode continuar com uma travessia de barco ou a pé pelo bosque. Em ambos, prepare-se para perder o fôlego com o belo visual.
+ PLITVICE
A 166 quilômetros da capital Zagreb, Plitvice é perfeito para passar o dia ou para uma visita de poucas horas para os viajantes que seguem para a costa. Há, também, a opção de se hospedar em um dos quatro hotéis do parque ou nas áreas de camping.
DUBROVNIK
É vista de cima que a cidade é mais famosa. As centenas de fotografias que retratam Dubrovnik circulam o mundo, mostrando os muros e as belezas naturais que a cercam. É verdade, todo o contorno é muito bonito, mas é em solo que o destino procurado por quase 3 milhões de turistas em 2011 é mais interessante. Caminhando pelas ruas da região histórica é que se percebe que os prédios suportaram o tempo e as guerras, mas os telhados foram, em sua maioria, substituídos. As telhas de terracota, assim como os habitantes que abrigavam, sofreram com os bombardeios da guerra de 1991.
Ao declarar independência, a Croácia viveu severos ataques do exército iugoslavo, com maior incidência em Dubrovnik. A cidade conseguiu se libertar em 1992, mas a iminência de retaliações permaneceu por mais três anos. Com o fim da guerra, os danos foram reparados e a memória do povo croata também. A reconstrução trouxe de volta o turismo para o paraíso mais conhecido do país.
Das muralhas de cerca de 25 metros de altura e até 6 metros de espessura, qualquer um se sente grande. Nem o sol, iluminando forte os curiosos, tira o ânimo de esticar o passo pelos 2 quilômetros de chão e conhecer um pouco da história de bravura de Dubrovnik.
Entre os meses de maio e setembro, a região chega a receber até oito cruzeiros por dia. É nesse período que o lugar é mais movimentado e a renda dos moradores se estabelece, por meio do comércio ou atividades ligadas ao turismo, para se manter no inverno. É quando o famoso barbeiro Hrvojeikato, do salão Muški Frizerski, ri à toa, já que os fregueses agendam um horário só para conhecer a barbearia que mais parece um armazém e o simpático senhor que coleciona fotografias com ilustres na porta do local.
A influência dos italianos na cidade é tanta que os cardápios estão cheios de pizza e massas para agradar o paladar dos vizinhos que passeiam por ali. O vinho segue todas as refeições, mas de um jeito croata que não deixa dúvidas de quem manda no território gastronômico da cidade. A bevanda, metade vinho (branco ou tinto), metade água sem gás, é um segredo dos bons de copo. Ela permite que se beba ao longo de todo o dia sem dar vexame.
Os bares acendem a noite ou com televisões sintonizadas nas partidas de futebol ou com boa música. O café Troubadour serve como ponto de encontro aos jovens locais que se reúnem para ouvir um pouco de jazz e discutir o dia a dia. O som quase vence o narrador futebolístico até o grito de gol. Sorte que jogo não é todo dia e os músicos só param para dar aquela espiada de leve no marcador. São resistentes como a cidade que os protege e que é, também, preservada pela Unesco.
+ DUBROVNIK
Pode ser vista do teleférico de 405 metros de altitude. O sistema, bombardeado e interditado durante os conflitos de 1991, reabriu em 2010 com o percurso que começa na cidade histórica e segue até o Monte Srdj. Lá, a vista panorâmica e um museu sobre a guerra reforçam o porquê de o lugar ser cercado de cuidados.
PARA ESCAPAR
Cavtat é onde o tempo passa mais devagar e os croatas parecem gastar os dias de verão longe da agitação das principais cidades. Distante apenas 15 quilômetros de Dubrovnik, o centro pertence ao município de Konavle e tem atrações tão tranquilas quanto suas ruas. Todos os anos, nos meses mais quentes, Cavtat recebe o segundo maior torneio de polo aquático da Croácia e “exporta” jogadores para outras regiões do país. A sensação de sossego continua nos restaurantes da promenade e segue no caminho para o museu do pintor Vlaho Bukovac (1855-1922), um dos mais importantes na história da arte croata. O estúdio, na casa onde morou com a família e criou as principais obras, se mantém com uma coleção permanente de seus trabalhos. A cidadezinha é um refúgio. Para o turismo de luxo ou para os menos afortunados, para descansar nas praias, para abusar dos frutos do mar, para contemplar e celebrar o nascimento e a vida, já a morte fica para o cemitério, outra atração local. E até essa vale a pena ser apreciada.
CROÁCIA: PARA CHEGAR LÁ
O território, que já foi palco de sérios conflitos, exibe um cenário que convida à boa vida. Pelas cidadezinhas da região, paisagens, parques e histórias de sobra
ESSENCIAIS
Como chegar
Zagreb, Split e Dubrovnik têm aeroportos internacionais que dão acesso aos principais pontos turísticos da Croácia. Se a chegada for por Zagreb, o melhor é alugar um carro. A viagem da capital até o Parque Plitvice leva cerca de 2 horas. Mais 3 horas na pista e se chega a Split. As condições das estradas são boas e as paisagens do litoral valem o percurso. O trajeto entre as cidades também pode ser feito de ônibus. As passagens estão à venda nas rodoviárias de cada região e o ideal é ter kunas (KN) em mãos – algumas empresas não aceitam outra moeda que não a croata. O site Autobusni Kolodvor publica informações sobre transportes no país. A Raidho Tour Operator oferece um pacote de sete noites com passeios por Zagreb, Plitvice, Split, Trogir, Mostar e Dubrovnik com hospedagem e guia (sem passagem aérea) a partir de € 2.528 por pessoa. A Destine tem o roteiro Croácia Imperial de oito dias com passeios pelas principais cidades do país a partir de € 2.200 por pessoa.*
Melhor época
Os meses do verão europeu são os mais movimentados. O país vai entrar para a União Europeia em julho de 2013, ainda sem expectativa de mudança na moeda local, a kuna. Por isso, é bom aproveitar o momento em que o real ainda vale mais (R$ 1 real equivale a cerca de 3 KN).
NOVE SUGESTÕES PARA CURTIR A CROÁCIA
1. Split, a segunda maior cidade da Croácia, tem inúmeros cafés para recuperar o fôlego após exaustivas caminhadas. Uma fatia de pizza acompanhada por um pint de cerveja é bem comum por lá e é uma boa dica para recarregar a energia.
2. O Hotel Radisson Blu, em Split, é um paraíso na região. Para quem viaja com grana contada, confira o hostel Goli and Bosi, dentro do Palácio de Diocleciano.
3. A guia Bethsy Oclocho-Špoljaric é a única no parque de Plitvice que fala espanhol. Para solicitá-la, basta agendar com antecedência uma visita guiada.
4. No Palácio de Diocleciano, a torre do sino na Catedral de St. Dominus tem 60 metros de altura e pode ser visitada. Lá de cima, a vista de Split é ainda mais bonita.
5. Dubrovnik tem uma das maiores redes hoteleiras da Croácia, com diversificadas sugestões para todos os gostos e bolsos. No site oficial de turismo da cidade é possível encontrar lugares bacanas.
6. Antes de ir embora, despeça-se do país com um pouco do autêntico sabor local. O restaurante Konoba Vinica, a 20 quilômetros de Cavtat, tem uma mesa sobre o rio, que flui embaixo dos pés, e deixa a memória longe e saudosa.
7. Faça uma caminhada noturna pela cidade histórica de Dubrovnik. As luzes refletidas no chão lustrado pelos pedestres durante o dia parecem pintura.
8. O Klub Art Radionica Lazareti é um centro cultural independente que reúne artistas contemporâneos de Dubrovnik, e à noite promove uma espécie de balada sustentável.
9. O museu War Photo Limited, em Dubrovnik, tem uma mostra permanente de fotografias sobre o período de conflito (1991-1995) e exibições temporárias. A aula de história vale a pena.