Hipócrates – o “pai da medicina”

Hipócrates, o “pai da medicina”: biografia crítica

1. Breve introdução à biografia grega antiga

Nome: Hipócrates
Local e ano de nascimento: Cós, 460 a.C (?)
Local e ano de falecimento: Larissa, 380 a.C. (?)

“Um relato sobre a vida de um homem desde o nascimento até a morte é o que se chama biografia” (MOMIGLIANO, 1993). Parece óbvio, em nossos dias; mas, embora relatos relativamente detalhados da vida de pessoas ilustres remonte no mínimo a Heródoto, que viveu na Grécia Antiga durante o século V a.C., a biografia iria se desenvolver como gênero literário somente na segunda metade do século IV a.C. e no século III a.C. Nessa época, os autores gregos começaram a voltar sua atenção mais às contribuições individuais dos membros de suas comunidades do que às coletividades (GONZÁLEZ; LÓPEZ FÉREZ, 1977).

Durante muito tempo, porém, a biografia iria se restringir à enumeração mais ou menos anedótica de feitos e eventos tradicionalmente atribuídos ao biografado, sem excessivas preocupações com a verdade histórica. Plutarco, um dos mais ilustres biógrafos da Antigüidade, tinha plena consciência do fato: “não escrevemos histórias (1)”, disse ele, “e sim, biografias; de modo algum estão presentes, nos feitos mais notáveis, a virtude ou o vício” (Plu.Alex. 1.2). Grande parte das “biografias” criadas durante a Antigüidade eram, por isso, constituídas de anedotas e de informações deduzidas a partir da obra dos autores biografados e de comentários dos antigos escoliastas, e não de dados históricos reunidos de forma crítica.

Essas antigas biografias, conhecidas por “Vidas” (2) e habitualmente inseridas pelos copistas nos papiros e pergaminhos em que copiavam as obras dos diversos autores, recebiam estatuto de verdade inconteste à medida que os séculos corriam e as cópias se sucediam. Exemplos clássicos são as pseudo-biografias dos poetas épicos Homero (séc. VIII a.C.) e Hesíodo (c. 700 a.C.), dos poetas trágicos Ésquilo, Sófocles e Eurípides (séc. VI-V a.C.) e do filósofo Pitágoras (séc. VI a.C.). A crítica moderna, felizmente, tem encarado com ceticismo crescente a maioria dessas informações (LEFKOWITZ, 1981).

É imperativo, portanto, que se adote a postura mais crítica possível diante de todas as informações veiculadas pelas Vitae da Antigüidade.

Notas

(1) Plutarco usou, nesta passagem, o antigo termo i(stori/aj, “investigações”, que remonta a Heródoto (Hdt. 1.1) e de onde se originou o vocábulo moderno “história”. Um dos mais antigos autores a usar a palavra com o sentido que lhe damos hoje foi o orador e erudito romano Marcus Tullius Cicero (106-43 a.C.). As palavras em grego antigo estão em negrito e foram formatadas com a Fonte SPIonic, da Scholars Press, que pode ser obtida gratuitamente no site Grécia Antiga. As abreviaturas utilizadas neste artigo estão junto à bibliografia.

(2) A palavra grega bi/oj, pl. bi/oi, corresponde ao latim uita, pl. uitae.