Florida Além dos Parques

A expressão déjà vu, aquilo que dá a impressão de já ter sido visto, não se aplica a Miami nem a Orlando. Há sempre novos ângulos e caminhos a ser descobertos. E outros que mudaram radicalmente. Alguém já disse: “não vemos o que vemos; vemos o que somos”.

Logo no desembarque no aeroporto internacional de Miami é possível constatar mudanças: as instalações passaram por uma competente repaginada. A construção já era ampla, mas o conforto cresceu consideravelmente, com mais esteiras rolantes para o usuário. E o trenzinho MIA ganhou outra extensão até a área destinada às empresas que alugam veículos. Chegamos no dia da inauguração e houve alguma confusão com a falta de informações. Mas agora tudo já deve ter entrado nos trilhos.

Por outro lado, há certas coisas que não mudam. Após rodar alguns quilômetros paramos na Ocean Drive para constatar que o apelo segue sendo os edifícios no estilo art déco. O glamour dos anos 1920 está todo ali, nas fachadas de hotéis e restaurantes. Calor de 35 graus. Pouca roupa, praia a poucos metros. Mar calmo, com águas esverdeadas. Mesmo ao meio-dia, muita gente fazia o seu jogging habitual e jogava vôlei na areia.

Mas ninguém é de ferro. As lanchonetes e restaurantes ficam lotadas para o almoço. Para felicidade dos garçons que aprovam descaradamente as peças minúsculas que se sucedem por ali. Os coquetéis são enormes. Parece que foram ajeitados em minibaldes. Margaritas de morango, mojitos… É preciso efetivamente ser duro na queda. Fomos ao Sea Cafe, no 740 da Ocean Drive. A brasileira Camila, que mora há mais dez anos em Miami, e já fala português com sotaque, fez uma promoção. Dois drinques por 25 dólares. A paella custaria 60.

Em Little Havana, o tempo não passa. Na Calle Ocho, é possível provar um pouco da Cuba dos anos 1950. Lojas e mais lojas dos famosos charutos, os puros, estão emparelhadas. Os proprietários efetivamente acreditam nos produtos que oferecem. Aparecem a todo momento na porta dos estabelecimentos para sorver e liberar mais fumaça. Aposentados americanos e cubanos não estão nem aí para o embargo econômico. Ao menos quando disputam animadas partidas de dominó no Parque Maximo Gomez. O único e modesto cinema apresenta como novidade o filme Mentiras Piedosas. Mensagem subliminar para o regime de Fidel Castro?

Miami Beach vale uma incursão noturna. Opte pela Lincoln Road, onde tudo acontece. Vestidos curtos para as mulheres. Camisas justas para os homens. E lá vão eles para a decantada prática do footing, ou da azaração, como queiram.

Dê um tempinho da culinária americana e visite um restaurante especializado em receitas italianas. O Quattro Miami promete cozinha honesta, massas caseiras e bom preço. Água, vinho, couvert, salada caprese e um delicioso ravioli com tartufo, mais café, a 60 dólares por pessoa, com serviço e taxas incluídos. Promessa cumprida. Se preferir algo mais barato, vá ao Bayside Marketplace, onde há dezenas de opções entre bares e restaurantes. Preços mais baixos e a linda vista da baía totalmente gratuita.

Orlando é logo ali

A viagem segue para Orlando. Quatro horas e meia de estrada que foram cumpridas sem pressa e com diversas paradas estratégicas. O primeiro break foi em Fort Lauderdale, distante apenas meia hora de Miami. A paisagem muda radicalmente, com diversas marinas que circundam a entrada da cidade. As lanchas ancoram nas residências em Las Olas Boulevard. Ali, o que importa não são os cavalos de potência dos motores, mas sim os pés que definem a extensão dos iates.

Pobres mortais chegam à praia com bom humor e criatividade: bicicletas com reboques, carrinhos de golfe reestilizados e até ônibus inspirados em bondes. Na faixa de areia, bebidas alcoólicas são proibidas. Fiscalização sempre rigorosa. Para driblar o sol de 36 graus, com a merecida cervejinha, só mesmo nos bares em frente, a uns 20 metros. Arrisque uma incursão ao bar Dirty Blondes. Sim, o nome é exatamente esse. Good luck.

Alguns quilômetros depois encontramos Palm Beach. Aqui impera ainda mais sofisticação. As placas avisam sem deixar dúvidas. Trata-se de um paraíso para poucos. Mansões com o chamado pé na areia, a poucos metros da água verde-azulada. Tudo privativo, com restrições de acesso muito claras. Não se está aqui incentivando a desobediência civil. Mas querem saber? Observe o cenário emoldurado por palmeiras e, com o famoso jeitinho brasileiro, dê um mergulho nessas águas quentes. Se o sol nasceu para todos, esse marzão idem.

Em Orlando, tudo é distante e passa necessariamente por pistas largas, bem sinalizadas, de avenidas e estradas. Todo mundo já te alertou, mas lá vai outro reforço: preste bastante atenção com o caminho. Qualquer erro pode significar milhas e milhas até o próximo retorno. Nem os GPS ficam imunes a esse problema. Um dos principais points nas noites de sábado é a Church Street, no centro velho. Um calçadão só para pedestres, com um simpático trem que corta a rua, imprimindo mais charme. Os jovens de Orlando marcam presença e iniciam “os trabalhos” em alguns barzinhos descolados. Depois enfrentam a maratona de baladas na Dragon Room, Mako’s e Bliss.

Confira o Ceviche Tapas Bar & Restaurant, ali no número 125, com uma arquitetura espanhola sem falsos exageros. Os brasileiros ainda não descobriram sua gastronomia. Carta de vinhos e cervejas abrangente. Jamon serrano, tabla de quesos e o ceviche de la casa são opções atraentes. Dois tipos diferentes de tapas, mais a cerveja negra modelo, sobremesa e expresso custaram 60 dólares. A casa também se especializou em shows de flamenco, reservando área específica para quem, ainda pouco afeito ao sapateado, resolve pagar esse mico.

Foi estranho o começo de domingo, 11 de setembro, em Orlando. O país inteiro se preparara para relembrar os atentados às Torres Gêmeas, que vitimaram mais de 3 mil pessoas, em Nova York, há dez anos. Timidamente, os moradores apareceram em um dos parques mais importantes da cidade, o Eola. O assunto vocês podem imaginar qual era. Barack Obama em seu discurso escolheu um salmo da Bíblia no qual citou Deus e guerras. Ao que parece, os americanos deixaram de assimilar isso. A maioria ainda prefere um antigo presidente: Abraham Lincoln, que na Guerra da Secessão foi bem mais direto, ao dizer para uma mãe, que perdera cinco filhos nas batalhas: “Qualquer palavra pode ser fraca para falar sobre uma dor tão profunda”.

No começo da tarde, o astral parecia um pouco melhor no Winter Park. Lojas descoladas abrem aos domingos para atender basicamente os locais. Por aqui, também parece que grande parte dos nossos conterrâneos ainda não descobriu os restaurantes refinados. Se quiser “tomar umas”, considere a visita ao Wine Room, no 407 da Park Avenue.

O ar condicionado potente garante o conforto dos apreciadores que preferem escolher a bebida e tomá-la em taças. Garrafas de rótulos especiais estão abrigadas em dispensers. Sai muito mais barato tomar seu vinho aqui.

Visita obrigatória é o Charles Hosmer Morse Museum of American Art, logo ali no número 445, também da Park Avenue. O local abriga obras de um dos mais criativos designers do século 19. O sobrenome de Louis Comfort Tiffany lembra algo? O pai de Louis fundou a companhia que até hoje é famosa pela exuberância das joias. Louis quis alçar voo próprio como decorador, especializado em pinturas sobre vidros. Confira alguns dos vitrais mais famosos, que estão dispostos em várias salas. De todas as formas e com todas as cores, o filho pródigo privilegiou a estética, ao tornar ainda mais famosa uma espécie de artesanato que se transformou em joia.

Para uma noite agradável, experimente o Pointe, assim mesmo, escrito com “e” no final, na International Drive, 9101. Galeria de lojas e restaurantes descolados. O lugar surgiu há relativamente pouco tempo e vem sendo ampliado. Visitamos a Taberna Opa, uma opção alegre, servindo comida grega a preços módicos. Passado algum tempo, as mulheres são convidadas a dançar em cima das mesas. E aceitam. É o poder das cervejas. As garçonetes têm inscritas nas camisetas a palavra koukla, em grego, que significa beautiful girl.

Fomos atendidos pela cearense Izzy, estudante de economia numa universidade daqui. Ela deseja mesmo é voltar para a Praia de Cumbuco, nos arredores de Fortaleza. Homus, mussaka, cerveja grega, iogurte caseiro com mel e castanhas, além de café expresso. Trinta dólares.

Com apoio da relações-públicas Mayra Ramos Miró, tivemos uma experiência gelada no Ice Bar Orlando. Do lado de fora, 26 graus. Lá dentro, os termômetros marcavam 3 graus negativos. Fomos levados a uma pista com iluminação indireta. O DJ nos brindou com a voz única de Adele, que deve funcionar como uma espécie de iniciação. Depois, recebemos da hostess pesados casacos de pele sintética e luvas. Ficamos parecidos com os dirigentes da Rússia. Abrem-se as cortinas e começa uma sensação térmica incômoda.

Encontramos o casal Shanna e Jim: os dois juram que estão ali há bastante tempo. Ela até tira o casaco e faz pose só de camiseta. Deve ser o poder da vodca russa.

Não tomamos um drinque sequer ali e o objetivo logo foi voltar para a noite abafada de Orlando. Com as lentes dos óculos ainda embaçadas pelo choque térmico, não acreditamos na cena surreal que vimos: uma casa de cabeça para baixo em plena International Drive. Era a sede do Wonder Works, um local cheio de atrações para sua mente, como pontua o folheto explicativo. Simuladores de furacões, terremotos e mais um traje de astronauta para explorar a réplica de uma cápsula da missão Mercury da Nasa. Há jogos de vídeo em que predomina a interatividade, sempre visando o estímulo da sua imaginação. O terremoto do simulador alcança 5.3 graus na escala Richter. É de tirar o fôlego.

No dia seguinte, só para conferir, Sea World. Logo na entrada do parque, somos guiados pelos gritos provenientes de uma incrível montanha-russa. É a Manta, na qual todo o percurso, pouco mais de dois minutos, tem de ser cumprido de barriga para baixo. Quem tiver estômago fraco, certamente acusará o golpe. Os movimentos imitam o deslizar de uma raia na água. Loopings, giros curtos, longos: tudo feito em uma velocidade estonteante. Outro objetivo do brinquedo é observar milhares de peixes coloridos no trajeto. Mas, com a pulsação acelerada fica difícil distinguir nuances. Você só deseja mesmo uma coisa: descer o mais rápido possível daquela geringonça.

O clássico show com as baleias sempre se revela um paradoxo. Como é possível mamíferos que pesam toneladas demonstrar tanta leveza? Sem falar na perfeita sincronia das participantes. Seus tratadores apostam na interatividade com a plateia. As baleias “dançam” música lenta e pedem palmas. Depois, um ritmo mais rápido. Se os aplausos não satisfazem, formam enormes ondas, molhando aqueles que sentam nas primeiras filas da arena. A cada movimento acertado, um reforço. Sempre na forma de muitos peixes, jogados pelos treinadores nas bocarras abertas.

Ponto batido, chega de Sea World. Uma tendência ainda pouco conhecida dos brasileiros é a comida em trailers, ou food truck. Diariamente, chefs levam seus restaurantes sobre rodas a diversos pontos do país. Isso tornou-se muito comum em Washington, Miami e, claro, Orlando. Em Lake Lily Park, distante uns 20 quilômetros do centro da cidade, encontramos sete minicaminhões estacionados à beira do lago. Casais com crianças, executivos, jovens fazendo jogging com seus cães, todos são bem-vindos. Condições sanitárias perfeitas nas cozinhas para atender ao menos 30 mesas e todo o pessoal que se espalha pelo parque. Especialidades das culinárias cubana, coreana, fish and chips, e até a mobile gourmet delicatessen. Vale a pena conhecer. Acontece todas as terças-feiras, das 18h às 21h. Como dizia a frase em um dos caminhões: “Food so good your mom will let you eat”. Preços a partir de 6 dólares.

Para não fazer desfeita, fomos ao parque da Universal, onde o bruxinho Harry Potter continua arregimentando milhões de fãs, sendo de longe a atração mais visitada. Seguimos o fluxo da multidão e terminamos no imenso castelo de Hogwarts. A réplica foi construída nos mínimos detalhes para que você se sinta no filme. Lustres, candelabros, quadros em que os retratados se movem e falam com você. Depois, a bordo de uma cadeira especial, um voo com a turma de Potter para a disputa do quadribol, diversos monstros à espreita e a saudação interativa dos personagens. A molecada sai em êxtase, querendo mais. Alguns adultos também.

ORLANDO E MIAMI: PARA CHEGAR LÁ

Cansado do Mickey e das montanhas-russas? Saiba que as duas famosas cidades da Flórida têm sempre algo mais a oferecer

ESSENCIAIS

Como chegar

Partindo de São Paulo, há voos para ambos os destinos, com ou sem escalas, operados por diversas companhias. Para Orlando, TAM, Avianca e Copa oferecem tarifas em torno de US$ 1.200. Para Miami, TAM, Delta e American Airlines voam com preços semelhantes, também por cerca de US$ 1.200, por vezes menos, dependendo da época do ano.

Circulando

Esqueça a idéia de que apenas quem vai às compras precisa de carro. Tanto Orlando quanto Miami são destinos com deslocamentos longos. Além disso, há muitas coisas interessantes nos arredores. Outra opção interessante – especialmente para quem gosta de fotografar muito – é o taxi-bike, uma espécie de triciclo colorido que anda a uma velocidade muito agradável. É possível encontrá-los em toda a extensão de grandes avenidas, tanto em Miami quanto em Orlando.

Vistos

Enquanto o visto continua sendo exigido, fique atento aos prazos de liberação. Em algumas cidades, ele pode demorar meses para sair. Consulte no site do visto americano os documentos necessários e os detalhes do procedimento.

DICAS ÚTEIS PARA CONHECER MIAMI E ORLANDO

Miami

DORMIR

O Marriott Biscayne Bay passou por uma repaginada a um custo de 31 milhões de dólares. Suítes espaçosas e classudas. Nem precisava tanto. A vista imperdível da baía, definitivamente, não tem preço (North Bayshore Drive, 1633. Diárias a partir de US$ 159).

COMER

No Luma on Park a cozinha fica no salão, aos olhos de todos. O resultado final é excelente. Carnes, aves e peixes irreparáveis. Carta de vinhos idem. A partir de US$ 80 por pessoa (South Park Avenue, 290, Winter Park).

COMPRAR

O charmoso centro de compras Coco Walk tem lojas tipicamente objetos de desejo de todos que buscam o american way of life – Victoria’s Secret e Gap são as mais procuradas.

Orlando

DORMIR

À primeira vista, o comprido e pomposo nome do Fairfield Inn & Suites Orlando Lake Buena Vista in the Marriott Village assusta, mas as suítes são confortáveis, tendo o básico necessário para uma boa hospedagem. A localização, essa sim, é estratégica, próxima aos parques. Diárias a US$ 79 dólares (Vineland Avenue, 8615).

COMER

Você vai se deliciar com os sabores inconfundíveis da Toscana no Brio. O restaurante funciona no sofisticado Mall Millenia. Amplos salões e frutos do mar especiais. Todos aqui seguem a máxima: “comer bem é viver bem”. Pratos a partir de US$ 60 (Conroy Road, 4200).

COMPRAR

O Orlando Premium Outlets é o maior outlet da cidade, com 170 lojas e preços ótimos. É preciso preparo físico para vencer seus corredores e driblar os brasileiros com suas imensas sacolas. Abre de segunda a domingo, das 10h às 21h (International Drive, 4951).

VIAJANDO

Alugar um carro é a melhor saída. Há pacotes que já incluem o aluguel – você pega o automóvel no próprio aeroporto (ótima e prática pedida). Vale pesquisar preços por temporada. Avisos aos motoristas de primeira viagem: o tanque vem cheio, portanto, precisa ser devolvido da mesma maneira; há pedágios urbanos – tenha à mão moeda local em notas miúdas; fique de olho no velocímetro – lá a velocidade é medida em milhas e não em quilômetros por hora; e comemore: ao contrário da Europa, não é preciso ter carteira de habilitação internacional (a nacional vale).