Duas faces de Um Mito. Processada pela Inquisição no século XVI, Branca Dias inspirou peças teatrais e romances que a transformaram num personagem-símbolo na luta contra a intolerância.
Há duas Brancas Dias: uma real, outra imaginária. A primeira pode ser conhecida consultando-se os documentos históricos e os estudos já escritos a seu respeito; a outra está nos romances e peças de teatro inspirados na personagem real. O problema é que muitas vezes as duas Brancas se confundem, e a ficcional toma o lugar da original. Ambas são cristãs-novas e, reais ou ficcionais, simbolizaram a opressão inquisitorial. Em 1929, o historiador Rodolpho Garcia, ao escrever a introdução à Primeira visitação do Santo Ofício às partes do Brasil, desfaria definitivamente o engano, mas nem por isso Branca Dias deixaria de continuar inspirando os ficcionistas e certos autores de obras supostamente históricas.
A personagem real nasceu em Viana da Foz do Lima, em Portugal, por volta de 1515, e morreu provavelmente em 1558 na capitania de Pernambuco, para onde migraram muitos cristãos-novos. Enquanto seu marido, Diogo Fernandes, instalava-se em Pernambuco, montando um engenho na sesmaria que lhe havia sido concedida às margens do rio Camaragibe, Branca, que havia permanecido em Portugal, era denunciada e presa pela Inquisição.
Acusada de “judaísmo” (a prática de ritos judaicos) pela própria mãe e por uma irmã, que já se encontravam presas, Branca admitiu a dita heresia, sendo assim libertada, em 1545, após renegar seus erros perante os inquisidores e cumprir as penas que lhe foram impostas. Foi em algum momento entre este ano e 1551 que ela veio para o Brasil com seus filhos, talvez como fugitivos, uma vez que a limitação de movimento era normalmente aplicada às pessoas condenadas pela Inquisição. Com a morte do marido, além de administrar a parcela que restava do engenho de Camaragibe após um fracasso parcial da sua exploração, Branca manteve em sua casa da Rua Palhares, em Olinda, com a ajuda das filhas, uma escola para ensinar meninas a cozinhar, bordar e fazer rendados. Mal imaginava que, trinta anos depois, já morta, suas ex-alunas a denunciariam ao visitador inquisitorial por práticas judaizantes no Brasil.
Em Memórias de Branca Dias, Branca Dias rememora a sua vida, da infância no Minho à velhice em Olinda, a sua prisão em Lisboa, a existência perturbada no engenho de açúcar, o levantamento da casa grande de Camaragibe e da casa urbana da rua dos Palhares (ainda hoje existentes), o convívio com Duarte Coelho, primeiro capitão donatário do Pernambuco, a morte de Pedro Álvares da Madeira, comido pelos tupinambás, o candomblé dos escravos pretos, os terrores de uma nova geografia e uma nova fauna, o martírio do povo miúdo português.
Duas Faces de Um Mito Resumo
Branca Dias é uma figura histórica que se tornou uma lenda no imaginário popular português. Sua história é marcada pela perseguição da Inquisição e por uma suposta conversão forçada ao cristianismo. A lenda da judia que se manteve fiel à sua religião até o fim tornou-se um símbolo de coragem e resistência. No entanto, há poucas evidências concretas sobre a vida de Branca Dias, e muitas das versões da lenda são baseadas em mitos e especulações.
Branca Dias nasceu em Portugal no século XVI, em uma família judaica que foi forçada a se converter ao cristianismo durante a perseguição da Inquisição. Ela se casou e teve filhos, mas a Inquisição começou a investigar sua família, acusando-os de manter práticas judaicas em segredo. Em 1624, Branca Dias foi presa e levada para a prisão da Inquisição em Lisboa. Lá, ela foi submetida a interrogatórios e torturas para que confessasse seus supostos crimes.
Segundo a lenda, Branca Dias se recusou a renunciar ao judaísmo, mesmo sob tortura. Ela teria sido condenada à morte na fogueira, mas teria preferido suicidar-se em sua cela, afirmando que preferia morrer nas mãos de Deus do que nas mãos da Inquisição. Essa versão da lenda enfatiza a coragem e a devoção de Branca Dias à sua fé.
No entanto, não há muitas evidências que corroborem essa versão da história. Os registros da Inquisição indicam que Branca Dias foi condenada à prisão perpétua, mas não há informações sobre sua execução ou morte na prisão. Além disso, há poucos registros sobre a vida de Branca Dias antes de sua prisão, o que dificulta a reconstrução de sua história.
A lenda de Branca Dias se tornou popular no século XIX, quando Portugal passava por um processo de redescoberta de suas raízes culturais e históricas. A figura da judia que se recusou a renunciar à sua fé em um momento de perseguição e intolerância religiosa tornou-se um símbolo de resistência e coragem.
No entanto, é importante lembrar que a lenda de Branca Dias também tem sido utilizada para perpetuar estereótipos e preconceitos contra judeus e outras minorias religiosas. Algumas versões da lenda retratam os judeus como pessoas vingativas e traiçoeiras, e a imagem de Branca Dias como uma mártir pode reforçar essa visão estereotipada.
Por outro lado, a história real de Branca Dias também é significativa. Ela representa a luta de muitas pessoas que foram perseguidas e marginalizadas por causa de sua religião, cultura ou identidade. Sua história nos lembra da importância de lutar por liberdade e tolerância religiosa, valores que são fundamentais em uma sociedade democrática e pluralista.
Em termos de legado cultural, a história de Branca Dias inspirou muitos artistas e escritores. O poeta português Fernando Pessoa, por exemplo, escreveu um poema em homenagem a ela, intitulado “Branca Dias”. A lenda também foi adaptada para o teatro e para o cinema, em diversas versões que retratam a coragem e a devoção de Branca Dias.
Em resumo, a história de Branca Dias é uma história de duas faces: a lenda que a tornou um símbolo de coragem e resistência, e a realidade que revela a complexidade e a falta de evidências concretas. No entanto, independentemente da veracidade da lenda, a figura de Branca Dias nos convida a refletir sobre a importância da liberdade religiosa e da luta contra a intolerância.